Paróquia
Sagrado Coração de Jesus

Poços de caldas - mg | Diocese de guaxupé

Paróquia hoje:

Como amar os inimigos?

Agora sejamos práticos e formulemos a pergunta: Como devemos nós amar os nossos inimigos?

Temos, primeiro, de desenvolver e manter a capacidade de perdoar. Aquele que não perdoa, não pode amar. É mesmo impossível iniciar o gesto de amar o inimigo sem a prévia aceitação da necessidade de perdoar sempre a quem nos faz mal ou nos injuria. Também é preciso compreender que o ato do perdão deve partir sempre de quem foi insultado, da vítima gravemente injuriada, daquele que sofreu tortuosa injustiça ou ato de terrível opressão. É quem faz o mal que requer o perdão. Deve arrepender-se e, como o filho pródigo, retomar o caminho do regresso de coração ansioso pelo perdão. Mas só o ofendido, seu próximo, pode realmente derramar as águas consoladoras do perdão.

O perdão não significa ignorância do que foi feito ou imposição de um rótulo falso em uma má ação. Deve significar, pelo contrário, que a má ação deixe de ser uma barreira entre as relações mútuas. O perdão é o catalisador que cria a atmosfera necessária para de novo partir e recomeçar; é alijar um fardo ou cancelar uma dívida. As palavras “Perdoo-te, mas não esqueço o que fizeste” não traduzem a natureza real do perdão. Nunca ninguém, decerto, esquece, se isso significar varrer totalmente o assunto do espírito; mas quando perdoamos, esquecemos, no sentido em que a má ação deixa de constituir um impedimento para estabelecer relações. Da mesma maneira, nunca devemos dizer: “Perdoo-te, mas já não quero nada contigo“. Perdão significa reconciliação, um regresso a uma posição anterior; sem isso, ninguém pode amar os seus inimigos. O grau da capacidade de perdoar determina o da capacidade de amar os inimigos.

Em segundo lugar, temos de reconhecer que a má ação de um nosso próximo, inimigo, – ou seja, aquilo que magoa, – nunca exprime a sua completa maneira de ser. É sempre possível descobrir um elemento de bondade no nosso inimigo. Existe algo de esquizofrênico em cada um de nós, que divide tragicamente a nossa própria personalidade, e trava-se uma persistente guerra civil dentro das nossas vidas. Há em nós alguma coisa que nos obriga a lamentarmo-nos com o poeta latino Ovídio: “Vejo e aprovo o que é melhor, mas, sigo o que é pior“, e ou como Platão, que comparava a pessoa humana a um cocheiro que guiasse dois cavalos possantes, e cada um deles puxasse o carro em direções opostas. Também podemos repetir o que disse o Apóstolo Paulo: “Pois não faço o que prefiro e sim o que detesto“.

Isso significa muito simplesmente que naquilo que temos de pior há sempre algo de bom, assim como no melhor existe algo de mau. Quando percebemos isso, sentimo-nos menos prontos a odiar os nossos inimigos. E quando olhamos para além da superfície ou para além do gesto impulsivo de maldade, descobrimos em nosso próximo, um certo grau de bondade, e percebemos que o vício e a maldade dos seus atos não traduzem inteiramente aquilo que ele de fato é. Observamo-lo a uma nova luz. Reconhecemos que o seu ódio foi criado pelo medo, orgulho, ignorância, preconceito ou mal-entendido, mas vemos também que, apesar disso tudo, a imagem de Deus se mantém inefavelmente gravada no seu ser. Amamos os nossos inimigos porque sabemos então que eles não são completamente maus, nem estão fora do alcance do amor redentor de Deus.

Em terceiro lugar, não devemos procurar derrotar ou humilhar o inimigo, mas antes granjear a sua amizade e a sua compreensão. Somos capazes, por vezes, de humilhar o nosso maior inimigo: há sempre, inevitavelmente, um momento de fraqueza em que podemos enterrar no seu flanco a lança vitoriosa, mas nunca deveremos fazê-lo. Todas as palavras ou gestos devem contribuir para um entendimento com o inimigo e para abrir os vastos reservatórios onde a boa vontade está retida pelas paredes impenetráveis do ódio.

Não devemos confundir o significado do amor com desabafo sentimental; o amor é algo de mais profundo do que verbosidade emocional. Talvez que o idioma grego nos possa esclarecer sobre este ponto. O Novo Testamento foi escrito em grego; e em sua versão original há três palavras que definem o amor. A palavra eros traduz uma espécie de amor estético ou romântico. Nos diálogos de Platão, eros significa um anseio à alma dirigido à esfera divina. A segunda palavra é philia, amor recíproco e afeição íntima, ou amizade entre amigos. Amamos aqueles de quem gostamos e amamos porque somos amados. A terceira palavra é ágape, boa vontade, compreensiva e criadora, redentora para com todos os homens. Amor transbordante que nada espera em troca, ágape é o amor de Deus agindo no coração do homem. Nesse nível, não amamos os homens porque gostamos deles, nem porque os seus caminhos nos atraem, nem mesmo porque possuem qualquer centelha divina: nós os amamos porque Deus os ama. Nessa medida, amamos a pessoa que pratica a má ação, embora detestemos a ação que ela praticou.

Podemos compreender agora o que Jesus pretendia quando disse: “Amai os vossos inimigos“. Deveríamos sentir-nos felizes por Ele não ter dito: “Gostai dos vossos inimigos“. É quase impossível gostar de certas pessoas; “gostar” é uma palavra sentimental e afetuosa. Como podemos sentir afeição por alguém cujo intento inconfessado é esmagar-nos ou colocar inúmeros e perigosos obstáculos em nosso caminho? Como podemos gostar de quem ameaça os nossos filhos ou assalta as nossas casas? É completamente impossível. Jesus reconhecia, porém, que o amar era mais do que o gostar. Quando Jesus nos convida a amar os nossos inimigos, não é ao eros nem à philia que se refere, mas ao ágape, compreensiva e fecunda boa vontade redentora para com todos os homens. Só quando seguimos esse caminho e correspondemos a esse tipo de amor, ficamos aptos a ser filhos do nosso Pai que está nos céus.